Saturday, February 27, 2016

A banalidade do mal na política brasileira

Às vezes, eu fico observando as redes sociais e o que rola na minha "linha do tempo" aqui e acolá e fico, sinceramente, preocupado.

O ufanismo nacional-desenvolvimentista (oi?) de parte da esquerda e o conspiracionismo comunista visível apenas à direita bolsonárica me parecem se encontrar num grau de abstração da realidade perverso, ao outro e à humanidade da própria alma. As militâncias, já radicalizadas pelos nervos à flor da pele, não conseguem fazer nada além de diálogos acalorados providos mais de ódio que de raciocínio.

É aquele horrendo ponto em que Paulo Henrique Amorin e Olavo de Carvalho já estão tão iguais que quase não se vê diferença.

Tudo para eles (a militância) é "mito" ou é "lixo" e "bosta" Aparentemente, não sabem utilizar palavras que passem muito desse vocabulário. Tratam o adversário como um inimigo a ser destruído e abatido, e muitas vezes dialogam com teorias e insinuações totalitárias perigosas.

Não tendo argumentos, partem para tudo o que há de mais baixo, vil e desonesto na alma humana, em busca de um ideal, ou suposto "bem maior". Seguem cindindo o país e propagando ódio numa paranoia coletiva ao melhor estilo "João Santana". Tratando pessoas como se unicamente matéria fossem. Ideias divergentes como se "burrice" fossem. Discordâncias como se "iditotice" fossem. Com todo o grau de desrespeito que a (agora mais que comprovadamente falsa) polarização nos ensinou a perpetuar.

Já fiz parte disso tudo, hoje me enojo ante a antigas atitudes.

Hannah Arendt, filósofa alemã que pra mim tem sido de grande inspiração, em suas reflexões sobre a "banalidade do mal", talvez tenha acertado em cheio quando disse que o mal, a níveis como vimos nos regimes totalitários na Europa Ocidental e em regimes comunistas no Leste Europeu, talvez encontre explicação na adesão imediata a irrestrita a ideologias sem a devida e profunda reflexão. Sendo o resultado disto uma transfiguração do ser humano num burocrata ideológico que, em nome de uma causa, poderá fazer, virtualmente, qualquer coisa.
Era esse, segundo Hannah, o argumento de Adolf Eichmann, responsável pela logística de morte do regime nazista, quando do seu julgamento em Jerusalém durante o pós-Guerra.
Para a filósofa (e teorista política), Eichmann se via apenas como um burocrata, alguém que estava cumprindo o seu papel diante de um bem maior. Para a nossa surpresa (ou não), o homem apelidado de "executor-chefe" enxergava-se apenas uma engrenagem a mais na máquina de moer carne do Nazi-fascismo.



Quanto a mim, precisei de um longo período de reflexão para entender que, na vida, e principalmente, na política, a "banalidade do mal" também existe. Ela está bem presente, todos os dias, na minha linha do tempo. Mas ela definitivamente não vale a pena.

Não vale a pena desfazer amizades por ideais divergentes.
Não vale a pena zombar das posições e ideologias democráticas das pessoas.
Não vale a pena incentivar o discurso de ódio.
Não vale a pena gastar o precioso tempo para escrever "textão furioso" na "linha do tempo" dos outros.
Não vale a pena dizer ou afirmar categoricamente coisas que não vi, não ouvi ou sobre as quais não tenho provas (e inclua aqui o "pó" do Aécio e a nuvem de fofocas que envolve as vidas de Lula/FHC).
Não vale a pena perder o senso crítico em nome de um ideal / partido / pensamento / teoria / ideologia.
Não vale a pena olhar apenas para o cisco no olho do meu irmão, deixando passar a trave no meu próprio.
Não vale a pena desmerecer, ridicularizar e escrachar alguém que votou em candidato divergente do meu.
Não vale a pena ir a páginas de políticos democratas com cujas opiniões discordo apenas para vomitar minhas frustrações.
Não vale a pena iniciar uma conversa-debate com a presunção inequívoca de que eu estou absolutamente correto.
Não vale a pena olhar a mim mesmo como baluarte portador da verdade, enquanto para o outro resta apenas a consumação de tudo aquilo que é mais burro, ignorante e descartável.

E por falar em descarte: não! Não vale a pena tratar o imaterial, o humano e todas as emoções e histórias que o envolvem como simples matéria que pode ser jogada fora. Aliás, a frase "é um lixo" me incomoda profundamente, e fico pensando que talvez fosse precisamente este o pensamento dos nazistas em relação aos judeus.

A "banalidade do mal" já nos causou problemas suficientes enquanto humanidade, provando que é capaz de provocar as situações mais terríveis quando levada às últimas consequências. E também já me causou problemas pessoais suficientes.

Posso errar; e com certeza errarei. Mas dela quero manter distância.
Posso até cair na tentação passageira da minha falibilidade humana.

Mas a gente segue tentando.

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